quarta-feira, 9 de novembro de 2011

DO OUTRO LADO DO NOJO !

O nojo me fascina e eu sempre desejei atravessá-lo: meu destino é atravessar o nojo e pegar a vida com as mãos. 

Exercitava, ainda bem criança, esse meu talento para com as coisas rejeitadas: ia pescar com o meu pai e ele me ensinou a botar a minhoca no anzol. Com muito gosto eu as cortava ao meio e as prendia com meus dedinhos finos. E depois as baratas de pesca, com suas perninhas de cócegas. E o pior de todos para mim: os bigurrilhos. Um tipo de verme branco e duro, cascudo, na verdade, que fazia um barulhinho grave quando enfincado no anzol. Assim: tluuc.

Mas fui corajoso e venci também este nojo. Assim, vencendo os pequenos nojos, eu sentia que avançava e não dependia, e que estaria depois preparado para o Grande Nojo da existência. Ajudava os primos com as iscas. O meu prazer nem era pescar: era ir além do nojo e me sentir, deste modo, mais maduro. 

Ver o peixe aberto também era tarefa curiosa. Melhor que o ato de pescar: eu não tinha paciência para esperar, queria logo ir transformando nojo em coisa sagrada.

O nojo é a etapa que antecede a experiência. O nojo é sempre uma imaturidade. O nojo é um não estar preparado para pegar a vida nas mãos. Mas é perigoso não ter nojo. É um estado de loucura e solidão íntima. É olhar para a vida simplesmente, e não colocar as coisas em estado de repugnância. É misturar-se em meio às coisas nojentas e de repente ser uma delas: fazer parte. Ser o próprio nojo. Eu sou: nojo. Eu grito daqui de dentro, do mole e do pegajoso da nojeira que é: existir. Porque na realidade todo mundo é perecível e tem um corpo que apodrecerá e servirá de alimento para baratas e vermes. Somos a carne que o nojo come.

Passo por você, Grande Nojo. Passe por mim para que o nojo seja também experimentado por quem tem medo do nojo. Faz de mim, Grande Nojo, teu instrumento. Mas venha todo enorme, causando-me medo também. 

Ofereço meu corpo ao nojo e que ele se aloje como um vírus e que contamine a todos, não com o meu vírus do nojo, mas com o nojo-de-dentro que possui todo coração que bate. 

Sei que o Grande Nojo é traiçoeiro, usa terno, tem unhas limpas e roupas sempre passadas e cheirosas. É para o Grande Nojo que eu vou. Mas trago meus pequenos nojos para lutar contra você, Grande Nojo, e assim você será apenas mais um. 

E eu? Vencerei a mim mesmo, a humanidade, ao mundo. Sem ao menos sair do lugar. Só por conhecido o seu outro lado.

2 comentários:

  1. Tenho um blog como você. Me identifiquei muito com seu texto. Me identifiquei muito com seu nojo de viver, de existir, de querer morrer.Obrigada.

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  2. Nojo de comida. Strogonoff, hambúrguer com queijo, carne com laticínios, mistura nojenta.

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